sexta-feira, 4 de novembro de 2011

The King

Eu sempre fui uma pessoa daquelas que se diz “normal”. Nunca fiz coisas que não se deveria por querer, sempre que fiz foi sempre por falhas banais que a vida me colocava no caminho. Cresci de uma maneira um tanto incomum, sempre com pensamentos muito afrente da minha idade, vivendo acima da média dos meus colegas, com planos e replanos com terceiras e quartas maneiras pré-preparadas para realizá-los. Na minha infância e grande parte da adolescência isso nunca fez grande diferença, afinal era muito mais fácil deixar para depois e ir assistir TV. Tive pais normais de classe média alta, uma infância de rotina na pequena cidade onde nasci e cresci. De todos os sonhos que tive um deles me veio muito cedo, o de ser professor. Tive uma professora que marcava ao começar suas aulas da disciplina de Inglês e graças a ela descobri o prazer que poderia ser dar uma boa aula, bastou uma aula, aos doze anos de idade, para descobrir que seria, de fato, aquela, minha profissão.
Anos de estudo após meu primeiro contato com esta segunda língua, que veio a ser umas das minhas paixões, realizei aquele pensamento dos doze anos, e me tornei um professor. Não demorou muito para começar a ser bem quisto por alunos e colegas de profissão, afinal eu havia apendido com uma pessoa de carisma e dedicação, profissional e amigável. Estava agora em uma cidade um pouco maior que aquela na qual cresci e acabei tendo um sucesso muito maior do que jamais havia imaginado dentro da minha profissão, apesar de nem mesmo ter a formação devida (ou pelo menos esperada) para o cargo. Uma vida aparentemente de muito sucesso e alegria, apesar da solidão que qualquer um passa ao morar sozinho apesar de seus amigos, os quais nunca me faltaram.
Minha vida caminhava apenas para o topo, calma e tranquila sempre regada a esforço, estudo e trabalho. Mas minha rotina começou a ser rompida numa segunda-feira chuvosa e fria de julho quando cheguei à escola que trabalho e fui bombardeado por uma notícia trágica, minha colega de profissão e área havia sido brutalmente assassinada na tarde anterior. Luto de quatro dias foi a máxima homenagem feita a minha colega, era incrível e aterrorizante lembrar que ela não estaria mais ali cuidando das suas crianças ou preparando suas técnicas lúdicas para seus alunos. Nada fazia passar o ar fúnebre que se instalou na escola naquele dia.
Assumi, a partir dos quatro dias de luto, as aulas dela. Trabalhar com crianças passou a ser, talvez, o maior desafio da minha vida, pois me faltava paciência e prática. Entretanto, coisas estranhas não paravam de acontecer ao redor da vida escolar da região, na semana que fora decretado luto outro professor da mesma área fora assassinado de forma ainda mais brutal que a minha colega da semana anterior. Já na segunda semana após o fato fomos visitados por um inspetor da polícia civil que estava encarregado do caso para interrogar a todos que tinham a mínima ligação com a professora morta. Passei tranquilamente pelo interrogatório, disseram-me apenas que não havia suspeitos para o crime ou razão óbvia para o determinado assassinato, mas já se especulava um provável serial killer, como dos filmes de Hannibal ou do famoso Jack the ripper. Sabia-se que este era excêntrico, e, aparentemente, gostava das histórias clássicas de seriais killers, pois, como de costume, havia criado uma marca, após matar colocava uma determinada peça de xadrez encravada na testa de sua vitima, o rei. Foi o máximo que consegui extrair do meu interrogador, afinal, comecei a ficar um pouco preocupado, dois professores de Inglês assassinados por um maníaco, era no mínimo preocupante, pois eu era um professor de inglês.
Aquela semana após o interrogatório passou quase dentro da normalidade rotineira, embora meu trabalho duplo de preparação de aulas para crianças e as notícias perturbadoras sobre os casos sem resolução e o apelido dado ao assassino “The King”. Este era o único fato sobre o assassino que a polícia havia liberado, outros detalhes eram boatos ou não confirmados oficialmente. Repórteres estavam constantemente nas portas das escolas entrevistando a todos, principalmente nós professores. Confesso que aquilo pareceu interessante no início, afinal propaganda grátis para minhas aulas particulares logo quando estava precisando de uma grana extra. Lógico que me sentia mau por aqueles fatos terríveis, mas aparentemente havia outros professores que estavam gostando ainda mais daquele circo montado pela imprensa, um deles inclusive falou ao jornal da cidade “Este assassino é um doente mental que acredita estar numa história de terror ou algo assim, espero que ele não cruze meu caminho porque “The king” vai virar “The Zumbi”, quando li não evitei o riso, afinal um magricela como aquele com certeza só estava querendo ganhar mais alunos mas, senti um arrepio na espinha e uma voz que parecia sair da minha cabeça disse “ele não devia ter falado isso, é o próximo!”.
Uma semana depois e as notícias esfriaram, agora as coisas pareciam mais calma, sem repórteres ou policiais nas portas das escolas. Foi desta maneira até o final de semana. No sábado, passei a noite inteira acordado sem conseguir dormir apesar de estar exausto após uma semana de aulas dobradas, quando era cinco da manhã resolvi sair de casa para caminhar por ai, já que o sono não vinha mesmo, poderia fumar um cigarro e caminhar na madrugada como costumava fazer na minha adolescência e provar um pouco mais dessa melancolia. Caminhei até a praça central fumando aquele último cigarro amassado da carteira quando algo pingou na minha cabeça, imediatamente olhei para cima para tentar ver se era chuva, mas não era. A cena era simplesmente bizarra, não encontro palavra mais adequada para descrever um homem magro de média estatura pendurado pelo pescoço por sua encharpe em um poste de luz com peças de xadrez no local dos olhos vestido com um terno esfarrapado e uma placa em seu pescoço escrito “The Zumbi King”.
Aquele foi com certeza o dia mais longo da minha vida. Passar das 7 da manhã até às 10 da noite dando mil depoimentos e retratos falados de alguém que eu, supostamente, deveria ter visto entre milhares de pergunta que me colocavam como provável suspeito do que estava sendo chamada maior história criminal nunca antes vista na cidade. Após todo o processo concluído finalmente fui liberado, sinceramente não entendi a frase final do inspetor sobre ficar de olho em mim, entretanto não liguei, não tinha nada a temer. Então voltei para casa já que tinha que trabalhar no outro dia, pois havia perdido todo o domingo dentro de uma delegacia fétida e desconfortável.
Segunda-feira e eu tentava retomar a rotina, mas era quase impossível retirar aquela cena bizarra da minha cabeça, um homem pendurado com os olhos dilacerados, e confesso, o medo começou a ficar cada vez mais forte. Eu parecia não ser o único a estar com medo, logo chegando à escola escutei boatos de que a coordenadora do curso de inglês da universidade local havia tirado uma licença médica e ido para o exterior tratar de sua misteriosa doença, já a dona de uma escola de idiomas local havia feito a mesma coisa imediatamente após o acontecido com o professor, todos os professores de inglês poderiam ser a próxima vitima, este era o único quesito adotado pelo assassino.
A cada dia que passava a apreensão aumentava. Não havia nem pista do tal matador nem mesmo de quem haveria de ser sua próxima vitima ou se ao menos haveria mais alguém. Eu estava muito receoso e ao mesmo tempo me sentia mais seguro do que nunca, beneficio que foi dado pela minha condição de suspeito, os agentes da P.C me seguiam a todos os lugares em todos os horários, era estranho, mas naquelas condições eu estava muito contente por ter “seguranças particulares” de graça. Chegando da escola na segunda sexta-feira após aquele crime quase fui atropelados pelos agentes que me seguiam, era por volta das 10 da manhã e eles então ligaram a sirene e quase iam levando tudo o que havia pela frente com a velocidade que estavam, não tive duvidas, outro havia padecido.
A brutalidade com a qual ele cometia seus crimes parecia não ter fim. A vitima desta vez era a professora de inglês de uma das escolas mais tradicionais da cidade, esta tinha algumas peculiaridades que a fazia famosa em toda a cidade. Ela era considerada uma das melhores sem questionamentos e quem não a conhecia por sua maestria com a língua a conhecia pela sua infindável beleza. Encontrada na banheira de sua casa, nua, enforcada com o cabo de força do secador de cabelos, inexplicavelmente teve sua cabeça raspada com precisão e no seu couro cabeludo entalhado como se fosse na madeira estava o símbolo do maníaco, o rei.
Confesso que só em pensar a maestria dos meus planos até aquele momento me enchiam de orgulho. Meu prazer ao ver a arquitetura brilhante que eu havia montado para cada um deles era quase tão grande quanto o próprio momento de suas mortes, os detalhes, a prática, a maneira como enganei os agentes que me seguiam debaixo de seus narizes, realmente a última, deu-me um prazer extra por este adendo. Por quê? Esta é uma resposta difícil de ser respondida, simplesmente cansei da mesmice e resolvi testar minha mente até onde ela poderia chegar em criatividade e brilhantismo. Mas agora tudo estava acabando, pensei em brincar com os outros professores da cidade, mas os dois únicos que sobraram merecedores de serem participantes do meu jogo haviam fugido, o que faria então? Precisava de mais um, e um que fosse bom o suficiente para enfrentar “The king” uma ultima vez, um gran finale digno de uma obra prima como a minha. Entretanto, só havia mais um, mas seria muito difícil orquestrar meu brilhantismo naquele extremo.
Um jogo de xadrez só acaba quando um dos jogadores captura o rei de seu adversário. Que outro além de mim seria um rei digno o suficiente para receber esta honra. Com o plano bolado e o alvo decidido, minha obra prima estava finalmente completa. Horas de agonia e prazer sufocante ao cumprir a espetacular cena final do meu espetáculo. Uma cruz no alto de uma catedral, e que rei capturar além do único conhecido e que de fato merecia este sublime título se não eu mesmo. Fui encontrado na manhã seguinte crucificado no alto da igreja mais alta da cidade com a marca do rei feita a fogo em meu peito. Meus feitos morreram, assim como eu. Marquei meu tempo e lacrei-me na história, meus registros ficaram em um lugar inalcançável que se abre com a chave, “The queen”.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Passou

‎Meu coração agora sente o peso sobre ele
O peso esmagador da sorte bárbara, inclemente,
A qual nada se pode opor.

Sonhos que tive antigamente, sonhos azuis onde estais?
O amor passou rapidamente e restou a saudade, nada mais.

Tudo passou rapidamente, louca talvez, louca de dor,
lágrimas a ver atualmente sobre as ruinas desse amor.
Tudo passou e o presente de tantos gozos sem iguais,
resta a lembrança unicamente, resta a lembrança, nada mais."

Rei Sonâmbulo

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Metáforas

Do lançar da semente,
o mover das mãos,
a terra faz sua parte
sendo o útero projenitor.

Fluindo pelo ar, as ondas,
quebram ao chegar na praia,
trazendo a mensagem da batida
do coração do oceano.

Ao ouvir as ondas,
as metáforas se transformam,
desmistificando o ardor do poeta.

As sementes, as ondas, mensageiros
do útero que brota e das quebradas do mar,
naquele infinito coração oceânico.